quarta-feira, 24 de março de 2010

O efeito da infelicidade no trabalho

Quando você estiver à procura do primeiro emprego ou de um novo emprego, não leve em conta apenas o tamanho da empresa, a reportagem maquiada que você leu sobre ela na revista, o salário e os benefícios. Considere, acima de tudo, se o ambiente de trabalho motivador e o sistema de valores da empresa.

Por Jerônimo Mendes

Você está satisfeito com o seu trabalho? Quando pergunto isso para os meus alunos, a maioria responde com um sonoro “sim”, mas na medida em que os temas da disciplina são abordados, e com eles os questionamentos, as opiniões se alternam drasticamente. Nesse caso, eu fico me perguntando: será que todos eram felizes até o momento em que eu coloquei a questão no ar? Se você perguntar a uma pessoa se ela é feliz, ela deixa de sê-lo no mesmo instante.


De acordo com uma pesquisa realizada pela Revista Você S/A e divulgada em maio de 2007, 84% dos executivos brasileiros estavam infelizes no trabalho, pelo menos naquela época; 54% deles estavam insatisfeitos com o tempo dedicado à vida pessoal; 76% deles acessavam e-mail profissional fora do horário de trabalho; 55% vivenciavam uma mudança radical no trabalho; e 58% deles alegavam que os cônjuges estavam descontentes com o ritmo excessivo de trabalho.


Nos Estados Unidos, um estudo divulgado na Conference Board revelou que 58,6% dos norteamericanos estavam satisfeitos com o trabalho, em 1995. Em 2002, a porcentagem caiu para 50,4%. O declínio mais acentuado ocorreu na faixa etária de 35 a 44 anos, onde a porcentagem de satisfeitos baixou de 61% para apenas 47%. Embora os números sejam antigos, não creio que os resultados sejam diferentes nos dias de hoje.


Quais os fatores que podem explicar a queda da satisfação no trabalho? Será que, apesar de todo conforto e tecnologia à disposição do ser humano, o grau de felicidade no trabalho está diminuindo? Muitos especialistas sugerem que o nível reduzido de satisfação pode ser creditado ao esforço e à pressão dos empregadores para aumentar a produtividade, o que resulta em sobrecarga de trabalho, prazos mais apertados para a realização de tarefas, metas cada vez mais desafiadoras e, por consequência, estresse, doenças e infelicidade.


Por outro lado, há uma questão mais intrigante: será que funcionários felizes são mais produtivos? Não acredito nisso. De acordo com Stephen P. Robbins, estudioso do comportamento organizacional, esse mito foi criado nas décadas de 1930 e 1940 como resultado, principalmente, de pesquisas realizadas na Western Electric. Com base nas conclusões da pesquisa, as empresas iniciaram uma cruzada de esforços na esperança de tornar os seus funcionários mais felizes e produtivos. Passaram a adotar práticas como melhoria das condições de trabalho, liderança participativa, seguro de vida, expansão dos benefícios de saúde aos familiares, bolsas de estudo, reuniões informais e até mesmo serviços de aconselhamento.


Apesar dos esforços, uma análise mais acurada dos resultados revelou que, se é que existe um relacionamento positivo entre felicidade e produtividade, essa correlação é baixa. Assim sendo, o fato de os empregados serem premiados com benefícios e salários mais atrativos não implica, necessariamente, em grau de satisfação mais elevado. Segundo Robbins, tomando-se por base as evidências, uma conclusão mais exata é que, na verdade, ocorre o inverso, ou seja, funcionários mais produtivos tendem a ser funcionários felizes, portanto, a produtividade leva à satisfação e não o contrário.


De fato, quando você realiza um bom trabalho, você se sente produtivo, útil, importante, bem consigo mesmo. Além disso, se a empresa onde você trabalha recompensa a produtividade, o bom desempenho pode significar o reconhecimento verbal, mais remuneração, promoção, benefícios de ordem indireta, importância perante os colegas, aumento do grau de satisfação com o trabalho e, obviamente, da felicidade.


O que acontece quando os funcionários estão infelizes no trabalho? Isso pode ser comprovado de várias maneiras nas empresas, em apenas alguns instantes de observação: funcionários que reclamam ou se tornam insubordinados em vez de pedir demissão, outros que boicotam as políticas e procedimentos esperando ser mandados embora para receber uma boa indenização e há ainda os que fomentam a discórdia no ambiente de trabalho em vez de tomar uma atitude para mudar a si mesmo.


Dan Farrell, Professor da Western Michigan University,afirmaque a insatisfação no trabalho pode ser expressada de várias maneiras:

Saída: comportamento dirigido para o abandono da empresa, incluindo a busca de um novo emprego e a demissão.

Comunicação: tentativa ativa e construtiva de melhorar as condições, incluindo a sugestão de melhorias, a discussão dos problemas com os superiores e algumas formas de atividade sindical.

Lealdade: espera passiva, porém otimista, de que as condições melhorem, incluindo a defesa da organização às críticas externas e a crença de que a empresa e seus dirigentes farão a “coisa certa”.

Negligência: deixar as coisas piorarem, incluindo o absenteísmo ou atrasos crônicos, redução do empenho e aumento dos índices de erros.

Outras consequências não mencionadas por Farrell devem ser levadas em consideração: apatia, desinteresse, valorização excessiva das recompensas materiais, indiferença e falta de comprometimento, rotatividade, produtividade baixa, ineficiência generalizada. Em geral, são poucos aqueles que se propõem a trabalhar arduamente para transcender os obstáculos.

O fato é que o desempenho e a satisfação dos funcionários com o trabalho tende a ser maior quando seus próprios valores coincidem com os valores da organização. Exemplo prático: uma pessoa que valoriza a criatividade, a liberdade e o conhecimento tende a não se adaptar em empresas que fomentam a hierarquia formal, a obediência e a conformidade de seus funcionários.

Considerando tudo isso, funcionários satisfeitos com o trabalho tendem a permanecer mais tempo no emprego e a tratar melhor os seus clientes. Portanto, as empresas e seus executivos em nível de liderança devem buscar constantemente conhecer as atitudes de seus funcionários. São as atitudes, observadas no cotidiano das empresas, que fornecem os indicadores de problemas potenciais, pois quando as pessoas realizam atividades inconsistentes ou incoerentes com suas próprias atitudes, os índices de absenteísmo e rotatividade também aumentam.

Por fim, quando você estiver à procura do primeiro emprego ou de um novo emprego, não leve em conta apenas o tamanho da empresa, a reportagem maquiada que você leu sobre ela na revista, o salário e os benefícios. Considere, acima de tudo, se o ambiente de trabalho é motivador e se o sistema de valores da empresa é compatível com o seu. Existem coisas que o dinheiro não remunera. Pense nisso e seja feliz!


Jerônimo Mendes, Administrador, Professor Universitário e Palestrante
Especialista em Desenvolvimento Pessoal e Profissional, apaixonado por Empreendedorismo

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